quinta-feira, 3 de maio de 2007

À Conversa com...

...Teresa Amaro, tradutora profissional

Revista Cultural – É realmente formada em tradução? Ou tirou outro curso?
Teresa Amaro
– Sou licenciada em Filologia Germânica. Pouco tempo depois de acabar o curso, empreguei-me como secretária, função em que me mantive durante dez anos. Como trabalhava no importador de uma marca alemã, a tradução, embora em doses moderadas, fazia parte das minhas atribuições. O gosto por esta actividade foi crescendo e quando, finalmente, me cansei do secretariado e comecei a procurar outros caminhos, este era o que se me apresentava como mais viável. Obtive uma colocação num gabinete de tradução onde trabalhava oito intensas horas diárias que me deram uma prática e uma experiência consideráveis. Como sentia, porém, a necessidade de uma base teórica sólida, frequentei o curso de Tradução Avançada do Instituto Britânico e o Curso de Metodologia da Tradução do Instituto Nacional de Administração. Considero estes três componentes – a formação universitária, a experiência prática e os cursos específicos de tradução – fundamentais para a profissão.

R.C – Trabalha num gabinete ou independentemente (freelancer)?
T.A – Trabalhei durante um ano num gabinete mas há dezasseis anos que desenvolvo a minha actividade em regime de freelancer.

R.C – Que tipo de tradução faz? Qual é o tipo que prefere?
T.A – Faço essencialmente tradução técnica e tradução de filmes e séries televisivas. A minha preferência vai claramente para a segunda por ser mais criativa e mais interessante. Como os filmes e séries se destinam a DVD, tanto trabalho obras recentes (Pirates of the Caribbean, Die Another Day, as séries 24 e My Name is Earl) como westerns com mais de 40 anos. Seja qual for o caso, estes projectos são tão interessantes que normalmente os traduzo de um só fôlego.

R.C – Poderá dar-nos uma informação mais específica acerca da tradução literária e técnica?
T.A
– Embora tenha colaborado pontualmente em projectos de tradução literária, a minha área é a da tradução técnica, e é desta que posso falar com mais propriedade. Cada uma delas tem as suas especificidades. Ambas exigem conhecimentos muito sólidos da língua de partida e da língua de chegada. Mas, na tradução técnica, a língua serve apenas de veículo para transmissão de conteúdos. Um técnico quando lê um manual para montagem de uma caixa de velocidades precisa de saber que a porca tal entra no orifício tal, e essa informação tem que ser veiculada da forma mais directa, objectiva e clara possível. Na tradução literária, a língua assume um papel de protagonismo, tem de ser devidamente explorada do ponto de vista formal. E quem lida essencialmente com a tradução técnica pode experimentar alguma dificuldade na tradução literária. Os ritmos de trabalho também diferem. Na tradução técnica trabalha-se, de uma maneira geral, com prazos mais curtos, ao passo que os projectos de tradução literária são de mais longo prazo. Quanto à remuneração, a tradução técnica é geralmente mais bem paga que a literária. Eu, por exemplo, cobro entre 70 e 90 cêntimos/linha aos meus clientes directos. Quando trabalho para gabinetes, são estes que determinam os preços, que são geralmente mais baixos, pois ainda têm que levar a margem do gabinete antes de chegar ao cliente final.

R.C – Como é o seu dia-a-dia profissional?
T.A – O meu dia-a-dia é muito imprevisível. Como não há fluxos contínuos de trabalho, tenho de adaptar constantemente a minha rotina diária ao que aparece. Mas, em geral, as coisas começam com um telefonema ou e-mail do cliente a perguntar se me encontro disponível para fazer um determinado trabalho. Procuro saber qual o número de palavras, a língua de partida, a área e o prazo. Aceite o projecto, abro uma folha com o título do trabalho, o nome do ficheiro que lhe vou atribuir, a proveniência e o prazo. Esta folha destina-se a facilitar-me o controlo da situação. Por vezes, recebo três ou quatro trabalhos na mesma semana, e esta é uma forma de gerir os prazos, servindo-me também, no final, para fazer as contas do valor a cobrar ao cliente, do IVA, da retenção na fonte, etc. Depois, é começar a trabalhar. Cada projecto oferece um grau de dificuldade diferente, dependendo da área e da língua de partida. Se há textos que traduzo sem consultar o dicionário uma única vez, outros há em que me vejo obrigada a fazer múltiplas consultas. Felizmente, a Internet veio facilitar muito a vida aos tradutores. Embora não dispense o recurso aos dicionários em papel, consulto frequentemente o Eurodicautom (dicionário da União Europeia) e faço inúmeras pesquisas no Google. Depois de terminar a tradução, procedo a uma revisão cuidada e envio o trabalho por e-mail ao cliente.

R.C – Esta profissão exige uma especial concentração e disponibilidade. Isso afecta, de alguma maneira, a sua vida pessoal?
T.A
– A concentração e a disponibilidade são vitais. A tradução é um trabalho intelectual de responsabilidade que exige um ambiente calmo, silencioso e sem elementos perturbadores. Para além disso, pode exigir horários de trabalho muito prolongados. Por vezes, torna-se difícil fazer a família entender que estamos em casa mas é como se não estivéssemos. Também é difícil programar saídas, férias, etc., porque, de repente, chega trabalho e a tendência é sempre para aceitar tudo o que vem para não se correr o risco de perder o cliente e também para assegurar meios de subsistência suficientes para períodos de escassez de trabalho.

Sem comentários: